MPF entra com ação indicando irregularidades no projeto do Rodoanel Metropolitano

Aproximadamente 100 povos e comunidades tradicionais podem ser afetados pelas obras

Irregularidades na mira do MPF

Uma ação civil pública foi ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF), para que a Justiça Federal suspenda de forma imediata, a maneira como estão sendo seguidos os procedimentos de consulta aos povos e comunidades tradicionais, afetados pelo projeto que pretende construir o Rodoanel, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Segundo o MPF, o Estado de Minas repassou as atividades de consulta para as sociedades empresariais Rodoanel BH S.A e Tractebel Engineering Ltda, porém, tal atividade tem natureza tipicamente pública, sem previsão legal da consulta livre ser feita por entidades privadas.

Ainda conforme o MPF, o caso é ainda mais grave, já que as duas empresas destinada a fazer a consulta, são contratadas pela referida concessionária do empreendimento e possui interesse econômico no projeto.

Indícios de irregularidade

A ação ajuizada pelo MPF pede ainda que a Justiça Federal invalide todos os atos praticados pelas referidas empresas até aqui, com essa finalidade.

Atualmente, ninguém mais ignora a obrigatoriedade de que o Estado respeite o direito à consulta livre, prévia e informada aos povos e comunidades tradicionais, mas o desafio está em garantir que a observância desse direito não exista apenas formalmente”, afirmam os procuradores da República Edmundo Antônio Dias e Helder Magno da Silva, que assinam a ação, ao site do MPF.

A Tractebel, empresa contratada para elaborar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do empreendimento e do respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), prevê que aproximadamente 100 povos e comunidades tradicionais estão presentes nas áreas onde serão realizadas as obras. Entre elas, as comunidades quilombolas de Pinhões, Manzo Ngunzo Kaiango, Arturos, Marinhos, Sapé, Rodrigues, Ribeirão, Colégio, Pimentel e Mangueiras.

Foto: MPF/Reprodução

Dever indelegável

De responsabilidade exclusiva do Estado, o traçado do projeto do Rodoanel tem extensão de aproximadamente 70 km, em pista dupla, cortando oito municípios (Sabará, Santa Luzia, Vespasiano, São José da Lapa, Pedro Leopoldo, Ribeirão das Neves, Contagem e Betim). Todos serão conectados através das rodovias BR-381, BR-040 e BR-262. O Estado de Minas Gerais será o responsável pelo aporte de R$ 3,07 bilhões para a construção da obra.

O Estado não pode delegar a realização da consulta a entidades privadas, por se tratar de uma obrigação pública indelegável, conforme assentado em decisões da Corte Interamericana dos Direitos Humanos, à qual está sujeito o Estado brasileiro”, lembram os procuradores da República, ao site do MPF.

A ação cita como exemplo, o caso Kichwa de Sarayaku vs. Equador, onde ficou expresso que a obrigação da consulta é de responsabilidade do Estado, sendo esse o motivo de o planejamento e a realização do processo de consulta, não poder ser feitos por empresas privadas ou terceiros.

A ação também reforça que a Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) é um mecanismo de diálogo entre os povos e comunidades tradicionais com o Estado, direito instituído pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e se tornou lei no Brasil no ano de 2004.

Foto: Willian Dias/ALMG

Esvaziamento

Conforme o MPF, é comum que governos promovam o esvaziamento da consulta, por meio de mecanismos e artifícios, como a sua realização em fases futuras, e não antes da elaboração do projeto.

Assim, enuncia-se o direito à consulta livre, prévia e informada e ressalta-se sua importância, mas ela é realizada como um ato meramente formal, desprovido de uma possibilidade real de permitir que as comunidades tradicionais participem efetivamente dos processos decisórios”, cita o texto da ação.

Com isso, elas se tornam uma mera formalidade, uma etapa a ser superada, um teatro democrático.

O MPF tem o entendimento de que essa situação é cada vez mais frequente nos projetos de grande porte, onde há o investimento de grandes quantias, já que a medida em que as etapas vão se consolidando, a consulta prévia feita nas fases mais avançadas da obra, tem um caráter mais de simulação do que de fato impacto relevante no projeto final.

Gustavo Campos: Nascido em Esmeraldas e criado em Betim. Formado em Jornalismo no ano de 2009 pelo Centro Universitário Newton Paiva, tem passagem como repórter pelas redações dos jornais O Tempo, Jornal Super Notícia e Jornal Aqui Betim. No Jornal Turismo de Minas, exerceu as funções de editor e repórter. Em ambas empresas, escreveu para as editorias de Cidades, Polícia, Gerais, Cultura e Gastronomia.